Márcia Barbieri
Nome
completo:
Márcia Benedita Barbieri
Nome
artístico:
Márcia Barbieri
Signo: Peixes
Religião: mística
Time
de futebol:
Palmeiras
Livro
de cabeceira: “O
obsceno pássaro da noite” (José Donoso), embora isso seja cambiável...
Sua
trajetória literária (livros lançados, participação em coletâneas etc.): Tenho três livros de contos
publicados: “Anéis de Saturno” (ed. Independente), “As mãos mirradas de Deus”
(Multifoco) e “O exílio do eu ou a revolução das coisas mortas” (Appaloosa) e
três romances “Mosaico de rancores” (Terracota), também lançado na Alemanha em
edição bilíngue “Mosaik des Grolls” (Clandestino Publikationen), “A Puta”
(Terracota) e “O enterro do lobo branco” (Patuá) – este foi finalista do Prêmio
São Paulo de Literatura 2018. Tenho participação em várias coletâneas.
Você
escreve para conquistar o mundo ou para agradar os consagrados?
Nem para conquistar o mundo nem para
agradar os consagrados. O mundo está cheio de gente idiota e mesquinha, não
tenho intenção de conquistá-los, além disso, seria inútil tentar. Em relação
aos consagrados, bem, gosto de alguns, mas não escrevo pensando neles, isso
seria castrador.
Escrever
é “questão de vida ou morte”?
Escrever está mais em sintonia com a
vida, a morte está mais relacionada às coisas estanques, enquanto a literatura
é mais movente, fervente, fluida...
A
literatura veio de berço ou de um amor não correspondido?
Nem do berço nem de um amor não correspondido, veio
de intrometida (risos).
Qual
a utilidade da literatura em sua vida?
Me sentir confortável em algum lugar.
Há
um ritual para você escrever? Qual?
Meus rituais são mutantes... Depende da época, do
livro que estou escrevendo. Gosto de escrever sentada na cama, com o notebook
no colo, música clássica, jazz ou blues, com incenso e café... Isso quase
não muda...
Tudo
é válido em literatura?
Tudo é válido sem sombra de dúvida.
A
crítica tem valor mesmo se o alvo da crítica é a sua obra?
Acredito no valor e na importância da
crítica, principalmente como divulgadora da obra. Isso não significa que creio
na crítica... E depois, se falar mal de algum aspecto da minha obra, bem...
Isso lembra a história que a minha mãe contava sobre a coruja e seus filhotes (risos).
Autor
ou autora que você ainda não alcançou:
Nossa!!! Muitos e muitos... James Joyce
em algumas obras, Clarice Lispector em outras... para citar pelo menos dois.
Entre
escrever a obra-prima que te dê uma vida gloriosa e uma morte tranquila, o que
você prefere?
Esta é uma pergunta capciosa... Não
acredito em uma vida gloriosa... mas, prefiro uma vida gloriosa... acho muito
difícil uma obra ser compreendida no tempo de vida do autor, a obra tem um
tempo de maturação, acredito que só posteriormente conseguimos compreender se o
livro faz ou não sentido.
Trecho do
romance em construção “A casa das aranhas” (terceiro da trilogia sobre o corpo)
essas palavras são dirigidas a você, por favor, não as
desconsidere, ninguém, ninguém mesmo, por mais insignificante que pareça,
merece o desprezo de outro ser vivo, primeiro sente, passe os dedos devagar
pela superfície do envelope, tente adivinhar o tamanho do papel que se esconde
por dentro do envelope, adivinhe o sentido duplo ou triplo das sentenças,
preste atenção aos hifens desnecessários, aos espaços exagerados entre uma
palavra e outra, as nuances e as coisas banais são sempre as mais divertidas, não
imagine que eu enviei essas palavras por confundir os remetentes, não se trata
de um engano, de forma alguma, eu jamais me enganaria com uma coisa dessas, não
é de hoje que premedito isso, antes de tentar amassar o papel e jogar no cesto
do lixo eu peço que leia, talvez eu devesse começar esta carta como todos os
remetentes, deveria procurar uma data, um lugar de envio, um intermediário para
entregá-la, mas como poderia saber um tempo exato para dizer as coisas¿ E como
poderia escolher um lugar e desconsiderar toda a imensidão do mapa¿ E como me
permitiria dividir segredos tão íntimos com um garoto de recados¿ Não queria
que ninguém além de nós dois engordurasse esse papel... eu sei que você pensa
que não deve considerar o discurso de um reles empregado, ainda mais um
empregado que não é dotado de músculos e nem possui uma face intrigante, porém,
essa falsa carta é escrita a você mesma, a mais inusitada das mulheres, aquela
que enganou o diabo e dormiu entre as pernas cabeludas de Deus, aquela que pode
ser amada três vezes simultaneamente, aquela que possui um espírito e três
corpos, claro, o corpo é só um pedaço de matéria, uma combinação estranha de
átomos, nem devíamos dar tanta importância a um amontoado de ossos, músculos,
pele e dentes, porém, não posso afirmar que desprezo a comensurabilidade dos
corpos, pelo contrário, os admiro com ardor. Eu facilmente trocaria o meu corpo
por outro mais saudável. Quando não somos dotados de beleza geralmente
idolatramos a perfeição alheia, de preferência do sexo oposto, já que do mesmo
sexo só nos traria desgraça, desejaríamos alcançar uma boniteza que está fora
de cogitação e nos perderíamos em lamentos infecundos e projetos frustrados de
aperfeiçoamento. Quantas cirurgias seriam necessárias para me tornar mais apresentável
e digerível aos outros homens¿ Não somos feito de pedra, não podemos ser
talhados ao gosto do escultor. A estética é um assunto que sempre me intrigou e
confesso que acho graça quando eu escuto as pessoas afirmarem que beleza não se
põe na cama. Talvez não se coloque na mesa, mas na cama um corpo bonito é mais
disputado. Quem sabe se eu fosse mais apresentável você jamais tivesse o prazer
de desfrutar da minha companhia quase invisível. Provavelmente me consumiria e
me mandaria embora para evitar a tentação. Um homem feio não representa perigo
e se assemelha muito a um eunuco. Agora me pergunto se você tivesse exatamente
esse mesmo corpo, lindo e perfeito e uma alma diferente, ainda assim teria
vontade de te foder inteirinha¿ Ainda assim descansaria a minha língua
no assoalho frágil das suas ancas¿ Ainda assim salivaria minhas angústias nas
beiradas chorosas da sua buceta¿ Difícil responder, nunca cheguei a uma
conclusão sobre a importância da carne no revestimento da alma, o certo é que
quando olho pelas frestas dos cômodos é o seu corpo que vejo, seus peitos,
sua bunda deliciosa, a sua buceta supostamente encharcada só
esperando um pau... E o meu pau latejando de vontade e tendo que
envergar para não romper a costura da calça. Será que você nunca percebeu o
fascínio que exercia sobre mim ou simplesmente fingiu ignorância para não ter a
responsabilidade da recusa¿ Afinal, de repente eu poderia me enfurecer e
partir... e então, você perderia um grande jardineiro. Eu me lembro que
costumava elogiar as minhas mãos, dizia que elas eram irmãs da terra e tudo que
elas tocavam germinava. Sim, era verdade e com certeza se eu te tocasse você
também haveria de germinar e talvez se multiplicasse ainda mais... e se eu
socasse meu membro ereto em você, você seria capaz de dar origem a um lago de
sêmen na cavidade do seu útero. Eu sei que você não esperava que brotasse
palavras de mãos tão brutas e aparentemente estéreis, provavelmente esperava
que saísse da minha boca apenas palavras de baixo calão (não que as despreze,
inclusive acho que elas expressam os sentimentos de forma mais verdadeira),
substantivos concretos e inexistentes ou dois ou três verbos simples, de
preferência terminados na primeira conjugação e que não implicasse uma fuçada
nos dicionários, sim, é verdade, sou quase um ogro e os calos devoraram quase
todos as locuções, alguns pelos ainda crescem nos meus dedos médios e anulares,
sim, eu sou o mais evoluído dos macacos, aquele que aprendeu a bater punhetas,
empunhar armas, fazer utensílios sem se importar com a rigidez das pedras e
cozinhar seu escasso alimento, eu sei que por vezes até chegou a cogitar que
fosse dotado de uma espécie peculiar de mudez, o silêncio evita
constrangimentos, e quantos vezes engoli a seco para te poupar de discursos vãos,
quantas vezes se contentou apenas com um gesto afirmativo ou negativo da minha
cabeça¿ Supondo que não fosse capaz de nada muito além do que um aceno rápido e
indolor. Como me doía saber que me considerava um ser pequeno, mesquinho (um
babuíno¿), que se balançasse com força poderia soltar alguns grunhidos. Pensava
que eu possuía um pequeno retardamento congênito, um cromossomo a menos ou a
mais, desses que só atingem a parte pobre da população, nasci quase miserável e
não considero isso motivo de orgulho, muitas vezes tive que presenciar a fome
dos meus vizinhos, tive que ver seus músculos se atrofiarem por causa do
excesso de peso, vi seus rostos se encherem de rugas precoces e os dentes se
exilarem de suas bocas. Vi a fúria desmedida dos governantes enchendo a cabeça
desses pobres coitados de falsas esperanças, vi policiais espancando seus
filhos, estuprando suas esposas. Gente pobre só serve mesmo para matar a raiva
e o tempo de gente ruim e poderosa. Nunca tiveram acesso à educação e os livros
eram enfeites em outras casas. Por isso, pouco me assusto quando vejo que pensa
que sou burro, inteligência custa caro e cai no mundo desprovido de bens,
nenhuma herança milionária, pois minha miséria foi passada de geração a
geração, foi herdada até mesmo pelos cães domésticos, pelos macacos adestrados
e pelos papagaios da redondeza. Não posso exigir que você seja a única pessoa
sensata deste mundo. Sim, as pessoas não costumam imaginar que os homens
ordinários escondam questões metafísicas em uma caixa de ferramentas ou que
reflitam sobre outros homens ou sobre as bombas atômicas enquanto tomam um café
com torradas, não imaginam que exista dentro deles algum desejo de se instruir,
que perdemos tempo com leituras extensas, fomos programados para adorar as
pedras e os martelos, então, por que se recusar a adorar as pedras e os
martelos¿ A metafísica pertence aos espíritos elevados e com uma pomposa conta
bancária, aqueles que comem brioches importados no café da manhã. Fomos
ensinados a admirar as porcas e os parafusos, e não devemos nos confundir e nem
deixar os outros homens mais abastados se confundirem, os rótulos simplificam
as coisas, se ao menos eu me escondesse atrás de um óculos e bigode escocês,
talvez fizessem uma imagem mais série de minha pessoa, talvez pudessem supor
que conheço a diferença entre filosofia e religião, entre alhos e bugalhos, ou
quem sabe se eu tivesse me criado em um lar com livros e parentes a minha sorte
fosse outra... para ser sincero com você, eu nasci do avesso, não me
surpreenderia se a parteira jurasse de pés juntos que a minha cabeça foi a
última a deixar o ventre da minha mãe, não deveria te confessar isso, mas
preciso ser sincero, os parafusos e as furadeiras nunca me deixaram à vontade,
sabe como é, é difícil convencer os outros que a ociosidade é o primeiro passo
para a genialidade, logo pensam que não passa de um vagabundo arrogante, que
precisa de uma boa desculpa para ficar coçando o saco. Já passou pela sua
cabeça que um homem que limpa a sua merda pode atingir uma mente lúcida¿ Você
se quer cogitou que um pensador passasse seus dias tirando merda de dentro dos
canos entupidos dos esgotos, sim, porque algum pedreiro burro fez um
encanamento muito estreito e os homens cagam muito! Não apenas metaforicamente,
eles cagam muito literalmente também. Você já imaginou que poderia estar
dormindo ao lado de um gênio¿ Aliás, você sequer imaginou que recusou foder com
um gênio¿ Você se quer imaginou que um gênio está nesse exato momento batendo
uma punheta pensando nas suas partes de dentro¿ Feio, horroroso, quase
corcunda, mas gênio¿ As mulheres gostam de foder com gênios¿ Não sei... Acho
que depende do tamanho do membro do gênio... Sei apenas que a humanidade quer
que se foda a genialidade, espera que respondemos prontamente aos problemas
simples, como desentupir a merda do encanamento, acabar com a
erva-de-passarinho que detonam as árvores frutíferas, exterminar os cupins que
comem os móveis da sala, arrumar uma torneira ou instalar um chuveiro é mais
essencial do que indagar porque os homens bocejam todos ao mesmo tempo, você já
reparou nisso¿ Basta um abrir a boca e lá vai todos os outros mostrando o céu
da boca como carneirinhos obedientes, bem, me disseram que apenas os psicopatas
não são contagiados pelos bocejos alheios, a psicopatia não me agrada, não me
recordo de algum dia tê-la visto bocejar... Fora tudo isso, infelizmente, nasci
em um corpo franzino e feio, que lembra muito uma cloaca de galinha, tenho uma
alma delicada e um tanto feminina, no entanto, ninguém percebeu, pois exigem
beleza de um corpo feminino e truculência de um corpo masculino. Ninguém sabe
lidar com meias medidas, as pessoas gostam de coisas extravagantes, grandes
demais ou pequenas demais. Já reparou como os pigmeus fazem sucesso¿ Eu não
possuo nenhuma dessas coisas, sou desengonçado demais para ser desejado por
homens e fraco demais para ser admirado por mulheres. No entanto, isso jamais
pode frear a minha imaginação e os meus desejos, a cabeça é um órgão
exuberante, graças a Deus! A minha cabeça ninguém controla e ela não se importa
com os meus poucos atributos físicos. Consegue façanhas inimagináveis apenas
com dois ou três estímulos externos. Pouco penso na falência do meu corpo
enquanto me masturbo. A minha feiura tampouco impediu as punhetas enquanto você
se banhava. E eu esperava ansiosamente essa hora chegar, quase sempre você se
banhava no mesmo horário e eu praticava os mesmos gestos, como em um ritual
sagrado. Bastava você entrar no banheiro e eu já me colocava no corredor,
quieto e atento, feito um ladrão que espera o silêncio das madrugadas para
efetuar o furto, quando escutava o ferrolho fechar tirava o pau para
fora com certo exibicionismo, na minha cabeça você era capaz de vê-lo, não
precisava fazer nenhum esforço, pois nessa hora ele já estava duro feito uma
rocha, então quando sentia o cheiro do sabonete sair pelas frestas da porta
começava a chacoalhar o pau com força até o líquido branco escorrer no
assoalho de madeira.
QUERIDA MARCIA,
ResponderExcluirpor favor coloque os anos de lançamento dos teus livros...
e quais estariam ainda para comprar ou venda nas LIVRARIAS....
sempre o erótico, o romântico e a imaginação criadora...
com carinho,
Poeta Pedrinho RENZI.
onde MORA o SOL.